07 outubro, 2010

Predator (1987) - Unicórnios a brotar de um arco-íris

Rua da Sofia, Coimbra, Primavera de 1987. Num período pós-Natal e pós-Carnaval pouca coisa existe para um jovem de 13 anos se entreter no caminho para a escola. As montras são cinzentonas e aquela loja que vende VHS está sempre a passar o Break Dance 2: Electric Boogaloo. Era interessante no início, chateia à 513ª vez. Nem os vendedores de calendários aparecem com novidades. Rambo? Tenho! Aviões de Combate russos? Tenho!Samantha Fox com as tetas à mostra? Tenho… debaixo da cama para investigação académica… Continuo a andar e eis que a meio da rua Visconde da Luz, numa zona dedicada aos cartazes dos cinemas, um confortável e quente clarão multicolor me atinge em cheio. Como uma explosão de cornucópias alucinogénicas misturada com o riso de mil crianças e um bando de unicórnios a brotar de um arco-íris, envolvido pelo cheiro de um campo de rosas ao triplo nascer do sol de Tatooine ao som de um coro de anjos, lá estava. Daqui a meio ano ia estrear um novo filme de Schwarzenegger: Predador! Caralhos me fodam se não senti uma erecção…

Bom, faltavam então 5 meses para o filme estrear, havia que começar a preparação. Aquela adrenalina provocada pela antecipação que, como todos sabemos, é bem melhor que o evento propriamente dito. Mas eram cinco meses de antecipação o que significava que havia entre os putos (proto) cinéfilos um estado de euforia quase tóxica muito parecida com um estado toxicómano recreativo muito comum na juventude, também conhecido por ganza. Mas não era esse o caso, porque com 13 anos pouco coisa havíamos ainda experimentado, e a lista das prioridades começava pela pinocada, passando pelo cigarrito, sendo que a ganza está ali guardadinha para os 16/18 anos.

Ainda me lembro do dia em que a professora de Geografia me chamou à terra. Era cedo, muito cedo, chuva e cinzento invadiam os céus. Eu imaginava-me a matar vietnamitas com uma enorme metralhadora num ambiente pós-apocalíptico. No meu sonho acordado era imensamente musculado e a fantasia acabava com uma bem torneadinha musa de joelhos a aliviar-me o stress por sucção. Essa musa era obviamente a minha professora de Geografia, que apesar de ser detestável como professora tinha um corpinho escultural responsável pelo inchaço que trazia na gaita provocado por excesso de fricção. Era este tipo de excitação que antecipava um grande filme.

Depois o filme estreou e lá fui com o meu pai, o meu super pai, especialista em cinema desde que em 1967 começou a frequentar as salas ao ritmo de 3 sessões por semana até que a vida de casado, os filhos e o trabalho lhe reduziram esta frequência. Ainda hoje me acompanha em assuntos de cinema, apesar da divergência dos gostos. Ela não gosta de CGI, eu não sou grande fã do Ben-Hur nem dos James Bonds com o Sean Connery. Mas isso são gostos.

O filme foi alucinante. Brutal, tudo aquilo que esperava e muito mais. As vertigens e os suores frios do êxtase cinematográfico obrigaram-me a ficar na cadeira a saborear o filme até ao final dos créditos finais. Esperava tiroteio, violência gratuita e carnificina em barda, mas ainda meteu extra-terrestres, uma consistente (para a época) história de ficção científica e boa banda sonora. Agora só faltava mais uma coisa: a colecção de calendários.

in CinemaXunga

13 Comments:

At 7.10.10, Blogger Priscilla Fontoura said...

"Tenho… debaixo da cama para investigação académica…" - Pedro és o melhor crítico de cinema português, qual tendinha qual quê!

 
At 7.10.10, Blogger Scometa said...

Vieste aqui colocar logo o que eu considero a melhor critica jamais feita ao Predator do McTiernan e que foi a razão pela qual propus a tua participação neste tasco. Quase verti uma lágrima por me fazeres lembrar exactamente aquilo que sentia na altura, porque apesar de ser de '81 vivi intensamente estes filmes, vi-os até à exaustão. Passei exactamente por esse sentimento de antecipação 4 anos mais tarde com o T2, no dia em que ele saiu em video (sim, na aldeola de onde eu venho o cinema fechou aí por final dos anos 80 e ir ao cinema era um evento tão raro e gracioso como comer o farrapo velho do dia 26 de dezembro). Lembro-me que existiam uns 3 ou 4 video clubes, e todas as 320 cassetes esgotaram no dia de estreia e eu pensei que ia morrer. Até que o meu amigo Ricardinho me diz que tinha o filme, e eu passei uma tarde solarenga do Verão de 1991, com o sol a brotar amiude por entre as frinchas das persianas no seu tom alaranjado e sorridente, a ver o filme até me cansarem os olhos. E chorava de cada vez que via aquela mão a entrar numa piscina de metal fundido e a fazer o sinal de OK. Sinto falta dessa sensação. Obrigado por me lembrares disso! Tens o dom da palavra.

 
At 7.10.10, Blogger Scometa said...

Talvez tenha sido Verão de '92, visto que os filmes demoravam basicamente um ano a passar de cinema para video. Mas lembro-me tão bem do cartaz desse filme nas montras dos clubes de video.

 
At 7.10.10, Blogger Cinema Xunga said...

Eu vi o T2 no cinema de Monte Gordo. Fiz amigos nessa noite (que ainda mantenho) devido a uma tertúlia pós filme que durou até de manhã.

 
At 8.10.10, Blogger Pereira said...

P2 é o filme favorito do Bruno Aleixo

 
At 8.10.10, Blogger Scapegoatt said...

0 "Predator", tb teve grande impacto em mim. Agora que me lembro do filme, como é possivel me esquecer daquele som tribal. Ainda não vi o remake, mas duvido que seja como o original.

 
At 8.10.10, Blogger naSum said...

Same here. Predador foi grande filme da minha infância apesar de ter sido um bocado mais tarde do que 91. Vi imensas vezes. GET TO THE CHOPPAAAAAAA!!!! Ainda esta semana vi o Predadores.

 
At 8.10.10, Blogger ::Andre:: said...

A crítica está brutal! Não é isto que dá pica ler em vez dos tiques e do snobismo que andam por aí? Caralho Pedro, mais! Entretanto penso num momento semelhante que me tenha acontecido com uma estreia de um filme...

 
At 8.10.10, Blogger Crestfall said...

Foda-se, "Rambo? Tenho! Aviões de Combate russos? Tenho!Samantha Fox com as tetas à mostra? Tenho…" tb tenho/inha isto tudo!! LOLADA. Tem a ver com os tempos de infância/adolescência mas tenho que é (quase) impossível hoje em dia qualquer filme despertar esse tipo de antecipação que se vivia na altura. Um gajo para arranjar uma novidade no video clube tinha que esperar décadas.

 
At 8.10.10, Blogger ::Cardoso:: said...

Eu também tinha um poster da Samantha Fox mesmo ao lado de um do Ian Curtis. Visto agora, com alguma distância, faziam um rico par.

 
At 8.10.10, Blogger Scapegoatt said...

"TOUCH ME, TOUCH ME, I WANNA FEEL YOUR BODY....."
=)

 
At 8.10.10, Blogger Tiago Esteves said...

Que classe de texto. Acompanho o blog do xunga há algum tempo e é este tipo de criticas que fazem falta. Tal como o André disse, já dispenso as análises snobs em que ao fim do 1º paragráfo já estou a mudar de página.

Acho que vi mais vezes o Comando que o Predador :D

 
At 8.10.10, Blogger Unknown said...

Devo dizer que quando vi o texto foi impossivel conter o entusiasmo!
Sou seguidor do CinemaXunga ha muito tempo (sem nunca ter comentado) e considero-o unico, naquela critica mordaz e na maneira como consegue passar a mensagem, o que acontece muito pouco a nivel de critica cinematografica!

 

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