01 março, 2011

fadoom?!

Já por várias vezes me questionei porque não temos a “cena” Doom mais interessante do planeta – convenhamos temos matéria prima de categoria para isso. Somos um povo deprimido, sempre com a confiança em baixo. Somos um país europeu periférico com características terceiro-mundistas. Enfrentamos uma crise social e económica profunda que acreditamos tão cedo não irá melhorar.
Será que o que nos inspiraria não faz mais que tolher-nos e nos deixa incapaz de reagir? É verdade, somos um povo apático, mas será que ninguém consegue abrir brechas na muralha da apatia e fazer algo?
Vejamos, fomos capazes de criar o Fado. Um género musical onde se desfiam rosários de traição, morte e desespero. Um género musical que de deprimente tem quanto baste, e ainda ninguém se lembrou de pegar nas suas escalas, transpô-las para uma afinação mais grave, e criar o Doom mais funéreo à face da Terra.
Não somos um povo criativo, é certo, mas diz-se que somos um país de poetas. Muitos desses poetas, aliás, eram tão deprimidos que se suicidaram, mas parece que as suas obras apenas conseguem inspirar os Trovante e afins.
Somos o povinho perdido entre a glorificação de um passado que nunca soubemos aproveitar e a mentalidade subserviente de esperarmos que nos mostrem o caminho. Sim, acredito nisto, quando a coisa pegar moda “lá fora” acorreremos em bandos para fazer o mesmo. Continuaremos sempre a glorificar a Vieira da Silva depois de ela ser francesa, a Paula Rego depois de ela ser inglesa, a rejubilar com o Nobel do Saramago refugiado em Espanha, alinharemos sempre ao lado daqueles que vilipendiaram o Soares dos Reis e o levaram ao suicídio. Em suma, seremos sempre incapazes de reconhecer o potencial que jaz adormecido. Preferimos, neste meu exemplo, reciclar My Dying Bride, Katatonia, e insiram quem mais quiserem aqui, a procurar uma voz única. A conseguir criar algo a partir das nossas raízes sem trazer agarrado o cheiro a mofo de glórias que já não significam nada.
Nisto, como em tantas outras coisas, temos tanto ao nosso alcance mas preferimos não ser nada...

14 Comments:

At 1.3.11, Blogger Priscilla Fontoura said...

concordo com o que dizes mas sinceramente pesa-me mais o lado optimista. acredito que somos criativos mas dados a invejas e, por isso, mais vale voltarmos o rosto a quem mais nos acredita. depois vem a hora da despedida e monta-se a tenda noutro lado qualquer desde que Portugal esteja longe da vista. ironicamente os amigos pouco batem nas costas e as entidades que deveriam numa primeira mão apoiar preferem que chegue o sucesso por outras vias e aí sim declaram à maneira épica este é português mas faz a carreira fora de Portugal.

 
At 1.3.11, Blogger Scometa said...

Estamos presos ao nosso próprio destino. Eu não sou muito apologista que a grande originalidade vem de criarmos algo a partir das nossas raízes, até porque em Portugal elas estão há muito esquecidas. A originalidade há-de chegar quando abandonarmos a nossa pequenez de espirito, e deixarmos de nos preocupar se estamos a imitar este ou aquele, ou procurarmos de tal forma ser diferentes que caimos no ridículo. A originalidade anda de mão dada com a honestidade, e só a partir do momento em que abandonarmos esta tendência de replicar tudo o que nos parece porreiro e passarmos a ser honestos com o nosso trabalho é que temos hipótese de fazer algo de valor. Aliás, não precisas de ser original para ser inovador, criativo e prolífico na tua arte.

 
At 1.3.11, Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
At 1.3.11, Blogger Priscilla Fontoura said...

acho completamente o contrário, por causa de querermos ser igual a tantas outras coisas nos reduz à pequenez de espírito e isso, quanto a mim, não é honestidade.

 
At 1.3.11, Blogger jorge silva said...

Priscila: fazes bem em olhar para o lado positivo, eu é que sou sempre um negativista do caraças.
Em relação às entidades de que falas, a minha crítica não era para aí direccionada, mas sim para quem cria. Acho que quem é criativo continua a dar largas à sua criatividade porque tem necessidade de o fazer, independentemente dos aplausos que possa, ou não, receber - é algo premente e que não dá sossego.
Eu tenho perfeita consciência de que com apoios o caminho pode ser mais fácil, mas esses apoios não são garantia de qualidade e é escusado pensarmos que, a existirem, funcionariam sempre bem e só seriam dados a pessoas de real valor.

Scometa: quando referi raízes, e por isso eu juntei "sem trazer agarrado o cheiro a mofo de glórias que já não significam nada", eu estava a entendê-las num sentido mais alargado. Não temos de adaptar a Florbela Espanca ou o Antero de Quental às letras de uma música, mas podemos "sentir o pulso" daquilo que transmitiam. Vê por exemplo o caso dos grupos de black metal que pretendem evocar o sentimento dos espaços naturais que os rodeiam - o tentar transmitir imagens e experiências sensoriais através de sons.
Basicamente é isto - se a arte é um reflexo da vida, então o que é que a nossa arte diz de nós? Porque razão estes sentimentos tão enraizados em nós não "brilham" e preferimos ofuscá-los em prol de uma reciclagem de estéticas? É a esta honestidade que me refiro.
A ideia é um bocadinho esta - vês grupos nórdicos a criarem funeral doom e pensas "os gajos não vêm o sol uma parte do ano. deve ser mesmo deprimente", enquanto nós temos sol todo o ano e mesmo assim somos extremamente deprimidos. E no entanto, onde é que isso se reflecte? Onde está a melancolia tão nossa de sermos o país que "fecha" a Europa e ficamos a olhar o mar? É a este tipo de recursos a nível de sentimentos, que já geraram o fado, e que são caracteristicamente nossos que eu acho que se poderia deitar a mão.

 
At 2.3.11, Blogger Priscilla Fontoura said...

Jorge o que entendes por "real valor"?

 
At 2.3.11, Blogger jorge silva said...

Já sei que o termo é discutível. Refiro-me aquela situação, que acontece muitas vezes, de os subsídios para isto e para aquilo serem atribuídos a quem tem os "padrinhos" certos e não a quem tem as capacidades que se justificariam ver desenvolvidas com a dita atribuição do subsídio.

 
At 2.3.11, Blogger Mafarrico said...

' A ideia é um bocadinho esta - vês grupos nórdicos a criarem funeral doom e pensas "os gajos não vêm o sol uma parte do ano. deve ser mesmo deprimente", enquanto nós temos sol todo o ano e mesmo assim somos extremamente deprimidos. E no entanto, onde é que isso se reflecte? Onde está a melancolia tão nossa de sermos o país que "fecha" a Europa e ficamos a olhar o mar? É a este tipo de recursos a nível de sentimentos, que já geraram o fado, e que são caracteristicamente nossos que eu acho que se poderia deitar a mão '

Acho que devias ter começado com isto, resume perfeitamente a ideia que colocas e realmente é uma pergunta pertinente. Não sendo eu um positivista nato, continuo a crer que o português, lá no fundo, não tem de todo uma negatividade-até-ao-tutano tão embutida assim. Quando entramos na União Europeia foi uma maravilha porque havia dinheiro para tudo e para empregos, mas agora que acabou, é que vimos que o que nos faltou aprender em estoicismo apreendemos qb em ambição. Mas ainda vejo sorrisos e motivos para continuar em frente nem que sejam esse mar, sol, praia e calor. Na Finlândia mal chega Setembro o metro mais parece um túmulo ambulante; vê-se na própria cara das pessoas uma sombra tal que coitados dos filhos deles por terem que levar com aquilo todos os dias..

 
At 2.3.11, Blogger vera viana said...

o problema é outro, e não passa por apoios desta ou daquela entidade, mas de nós próprios - deve haver alguma razão histórica para isto, porque parece ser genético - temos falta de confiança naquilo que somos capazes de fazer.
Há excepções, claro, que muito devem ser valorizadas, por conseguirem ultrapassar esta omnipresente limitação.

 
At 2.3.11, Blogger Priscilla Fontoura said...

eu sinceramente não acho que seja falta de confiança acredito que seja mais um preconceito que não nos deixa libertar. aceitamos muito mais depressa o que vem de fora e apontamos mais rapidamente o dedo quando alguém o tenta fazer dentro do país. até quando vemos um filme português, e tirando todos os outros elementos que podem fazer do filme medíocre, não nos sentimos confortáveis ao ouvirmos a nossa língua. mafarrico também não acredito muito nessa tristeza atroz acho que tem mais a ver com melancolia que outra coisa, com o sentimento histórico que nos prende ao passado.

sim o termo do real valor é discutível, mas se esses apoios não existissem alguns artistas não teriam tanta projecção tão rapidamente sem a garantia desses tais apoios, mas claro Vera que não é a ajuda desses tais apoios que fazem de um artista mais ou menos criativo. :)

 
At 2.3.11, Blogger ::Andre:: said...

Vocês acham mesmo que ainda somos um povo melancólico e deprimido? Crises económicas e sociais à parte, acham mesmo ou é um carimbo que já não sai do BI por muito que se esfregue?

 
At 2.3.11, Blogger Scometa said...

Qual melancólico e deprimido? Nós somos é bon vivants e preguiçosos.

Eu não aponto o dedo ao que vem do país, e sei que neste momento temos bons artistas, quer na àrea do cinema, da música, da fotografia, pintura, etc. Só aponto o dedo ao que acho mau, quer seja português quer seja estrangeiro. Por isso falava mais acima da questão da originalidade, porque parece um estigma que carregamos. Temos que fazer algo de novo e inovador para sermos bons, porque senão só estamos a imitar. Isso para mim é que é apontar o dedo injustamente. Ainda não estão criadas totalmente as condições para haver liberdade criativa no nosso país, porque a estrutura da nossa cultura ainda está muito centralizada e com bases muito titubeantes.

 
At 2.3.11, Blogger Unknown said...

Este comentário foi removido pelo autor.

 
At 2.3.11, Blogger Priscilla Fontoura said...

"Um em cada sete portugueses usa antidepressivos, segundo Eurobarómetro" sei que esses estudos muitas vezes suscitam dúvida mas como diz o outro, "os antidepressivos são uma coisa que sai bem nas farmácias".

não falo de originalidade mas de criatividade que quanto a mim não tem que ser desenvolvida no termo "globalizado" da coisa, o que faz muitas vezes que ela surja da imitação, ou seja, limitada e desfasada de cunho pessoal. mas sim ainda não foram criadas as estruturas necessárias :(

 

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