30 junho, 2011

Já não se diz olá?

Depois dum fim-de-semana extra-prolongado, já de volta à rotina habitual que acompanha os dias de trabalho, não tardou muito até que começasse a reproduzir memórias formadas durante a semana passada, mais especificamente dos concertos de Kyuss Lives!, Boris e Secret Chiefs 3.
Numa reflexão mais a frio, é possível traçar paralelos entre as bandas quanto à sua postura em cima do palco, pelo menos no que diz respeito à comunicação com o público, ou melhor, à falta dela.

O que é a música senão uma forma de expressão e por conseguinte, uma tentativa de comunicação? Porém, intriga-me que todas estas bandas releguem quase por inteiro o diálogo, porventura a forma mais básica de estabelecer uma relação de intimidade com o público. Esta espécie de afastamento voluntário será sobretudo uma opção estética ao invés de dificuldades linguísticas, sendo uma escolha cada vez mais comum por parte dos músicos.

Hoje em dia é comum ver bandas a promover uma espécie de amizade virtual, deixando os fãs entrar na sua esfera pessoal através do uso de redes sociais, studio reports e afins. Parece portanto paradoxal que se relegue o contacto verbal quando se deparam fisicamente com o espectador. Não acho isto moralmente errado ou desrespeitoso, mas creio que é indicativo duma mudança. Falta saber até que ponto as coisas vão mudar.

E para não deixar o post sem música, aqui fica um crowd greeting à boa "maneira antiga".

7 Comments:

At 30.6.11, Blogger Susana Quartin said...

Há concertos que pedem interacção, mas também há (mesmo) muitos que, imo, NÃO; depende tanto do que está a acontecer em palco. Um concerto não é, normalmente, apenas um debitar de músicas. Olha o "ritual" de MMOB. Era awkward terem uma atitude "à Motörhead" durante o concerto (E são as pessoas mais simpáticas. Na zdb um deles até meteu conversa comigo por me ver com uma t-shirt "antiga" deles).
Se tudo correr bem, cria-se sempre uma ligação entre os músicos e o público, que é feita através da música. Não é preciso mandar umas larachas para a malta rir (a não ser que sejam o Warren Ellis <3).

Não fui a nenhum dos concertos, nem no porto nem em lisboa, mas imaginar SC3 a interagir com o público é meio esquisito. Já de Kyuss talvez esperasse uma postura mais relaxada. Boris não me recordo se houve comunicação "verbal" em 2008 (ménes, o Atsuo atirar-se para cima das pessoas duas vezes para mim diz mais que 83274987 obrigados mecânicos e "you are the best"'s - podemos pegar na frase cliché "constantly talking isn't necessarily communicating."), desconfio que não e não senti falta nenhuma. É variável.

 
At 30.6.11, Blogger Rui said...

Basicamente também me parece que é muito dependente dos concertos, por vezes a conversa dos músicos quebra o ambiente por outra vezes ajuda a ligar as músicas, mau é o que aconteceu com os Russian Circles que paravam 1 minuto entre músicas e não falavam não acontecia nada, apenas pessoal a afinar instrumentos, isso quebra o ambiente e não gera empatia.

 
At 30.6.11, Blogger Pedro said...

Depende das bandas.

Dos Kyuss talvez esperasse uma atitude mais normal e cool, mas, se não conseguem o meio termo, então prefiro a falta de interacção com constante bajulação, obviamente exagerada e banal.


Ainda assim, quem olhou (falo pelo porto) para a cara do Garcia e do Oliveri notou ali boa disposição e que ele(s) estavam a curtir a atitude do público. Não o disseram, foi só.


Quanto aos outros, também os Boris (principalmente o baterista) pareciam estar a curtir da cena.


Os Russian Circles foram o caso mais choco. Pausas enormes e nem uma palavra, foi um bocado constrangedor.


Mas isto tudo depende das bandas. Há as que bajulam imenso com "óbrigádós!" e "voces sao o melhor publico que ja tivemos" e blablabla são uma seca. Há as que conseguem criar empatia porque de facto já andam nestas merdas há muitos anos e sabem interagir bem com o publico, sabem onde estão, sabem do que falam, permite-lhes falar e fazer-se entender (lembro-me dos Pearl Jam por ex)

E há os que basicamente se estão a cagar, vão para o palco, tocam e pronto. E se fizerem isso bem, também não podemos exigir muito mais. Fizeram o que lhes competia.

E tudo isto depende também do tipo de música.


A minha preferência? Aliar uma boa interacção (sem bajular) com o profissionalismo e competência em cima do palco.

 
At 30.6.11, Blogger ::Andre:: said...

Questão pertinente, sem dúvida, mas concordo com o que foi dito: depende das bandas e dos concertos. Eu não quereria uns Bohren a contar estórias entre temas ou até uns Isis, mas já um Broderick, por exemplo, ou uns The National que recentemente vi faz todo o sentido. Boris? Desses não terias mais que um "thank you" mal pronunciado por isso sim, a questão das redes sociais é hoje em dia um veículo promocional fundamental mas muitas vezes nem sequer geridas pelas próprias bandas.

Quando dizes que é um indicativo de mudança eu acho que sempre existiu mas tu apenas tens verificado isso pois tens gostos cada vez mais ecléticos que te levam a procurar outro tipo de bandas e música cuja oferta a podes encontrar mais facilmente nos dias de hoje.

 
At 30.6.11, Blogger  said...

Cada banda constrói uma identidade própria e devem ser sempre encaradas como uma entidade individual. Como tal, fará sentido para algumas bandas comunicarem com o público e outras nem tanto (Bohren é um exemplo muito bom nesse sentido, André).

A título de exemplo, o concerto de SC3 neste Domingo foi o que mais gostei dos 3 que já vi até hoje da banda, muito por culpa do ambiente informal e da recepção calorosa do público, que permitiu à banda ficar em silêncio enquanto era aplaudida, sem causar qualquer tipo de constrangimento. Já os outros 2 concertos que vi deles não houve este tipo de recepção e notava-se que a própria banda estava com uma postura mais contraída. Nesse caso, comunicar com o público tinha permitido criar uma atmosfera mais "confortável". Lembro-me também agora das longas pausas em WITTR, carregadas de feedback em que não havia nem manifestações da banda nem dos espectadores. O que se calhar até é a intenção deles, mas eu sou dos que acha que a música ao vivo deve ser uma celebração e não um acto de misantropia.

Isto tudo para dizer que mais do tipo de banda, isto da comunicação devia depender mais do "setting" e não ser uma postura pré-definida. É necessário saber motivar o público.

 
At 30.6.11, Blogger ::Andre:: said...

Parece-me que tens uma definição de concerto bem definida ou preferida e num eventual top de momentos colocarias esses onde existe mais comunicação e interacção com o público e vice-versa.

Eu não descordo, mas um excelente concerto, na minha opinião, não é só aquele que o público bateu palmas, dançou e saiu suado. Um concerto em que se fez silêncio na plateia durante toda a actuação também é sinal de respeito, admiração e respectiva celebração.

Quanto ao "setting", nós acreditamos que já é algo com que o promotor se deve preocupar, não a banda, mas na generalidade isso não acontece. Já vi gente a dormir em Murcof, por exemplo, e de outra forma não seria de esperar pois a sala era sentada. Que faria o músico em questão? Anedotas entre temas? Mas como estive envolvido em todas as passagens dos Chiefs por Portugal, aproveito para concordar com a observação que o Passos Manuel não foi, do ponto de vista do público, a opção esperada embora a ideal para o que se tinha em mente. Já no Plano B, tirando as limitações do espaço, parece-me que tudo correu lindamente e a própria banda ainda no domingo passado o recordou.

Sublinha o ponto de vista do público, é que nada é ao acaso e tudo tem uma razão. Eu pessoalmente faço um esforço por me (tentar) colocar sempre do outro lado e reflectir sobre as razões de determinada opção.

Desculpa se fugi do assunto, termino dizendo que acima de tudo, ver uma banda ao vivo é das melhores experiências que ainda se pode ter.

 
At 1.7.11, Blogger  said...

Por partes:

Não tenho uma definição rígida do conceito de concerto ou performance, mas tenho bem enraízadas as minhas noções do que constitui um bom espéctaculo dentro dum género de concerto. Ter começado o post com os exemplos de Kyuss, SC3 e Boris, além de serem as referências temporalmente mais adequadas ao tema em questão, também tinham como propósito dirigir o leitor para um tipo específico de música (chamemos-lhe simplesmente Rock) e consequentemente, de actuação. Não era objectivo fazer generalizações para outros áreas musicais, tais como jazz, clássica e afins.


Não acho que seja necessário dialogar directamente com o público para saber motivar o público, e parece-me que foi essa a ideia com que ficaram do meu texto. Não pretendia afirmar que a interacção verbal está directamente relacionada com o aproveitamento que o público (ou simplesmente eu) tem dum concerto, embora creio, que na maior parte das situações (uma vez mais, dentro do género de concertos de rock e afins) seja salutar.

Para rematar, acho curioso como (a meu ver) num par de anos começou a ser comum (dentro dos concertos a que tenho ido) este silêncio verbal (que pode não ser sinónimo de falta de interacção com o público). Hoje em dia já ninguém aparece num concerto sem saber quem está em cima do palco e isso pode ter influenciado de certa maneira a postura das bandas. Não precisam de fazer as apresentações ou de dizerem "esta música é do nosso último CD, está ali na banca, comprem se gostarem", entre outros clichés de promoção.

Não obstante, nada disto costuma diminuir o aproveitamento que tenho ver uma banda ao vivo. Apenas um (modesto) exercício de antropologia :)

 

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