28 julho, 2011

Daqui Ali - Texto Oito [A Lone Rider And His Feelings]


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Estou em Hoi An, neste momento no quarto do meu hotel, Hoi Pho I, pelo qual tive de pagar dez dolares. Ninguém com quem dividir a conta.Tem duas camas mas ninguém na outra, como muitas vezes acontece, seja com os belgas de Da Lat, o Martin no Camboja, a Sofia na Índia, Nepal, Tailândia e Malásia ou outros amigos que se fazem em segundos de inspiração. E é pena. É pena porque Hoi An é absolutamente fantástico e tive um dia excelente, caminhando entre as ruas de casas antigas e amarelas, passando pelas senhoras com o seu chapeuzinho cónico, atravessando a ponte para o lado ainda mais autêntico e vietnamita – mas sem ninguém de imediato com quem partilhar a alegria que tais visões assentavam na minha alma.
               
Depois de ter feito o percurso que o guia sugeria, e já em êxtase com a beleza da vila, entreguei-me à aleatoridade por um par de horas, e dei por mim no coração de locais tão reais quanto o céu azul que me aguentava, a dizer “hello” de volta às dezenas de miúdos e miúdas que me cumprimentavam, com a palavra, um sorriso e um aceno. Dei por mim sentado a observar a linha onde o rio, as montanhas e o céu se confunde, com os pescadores a passar periodicamente, lançando a sua rede com paciência, e entretendo as filhas, ou netas, que brincavam no barquinho de madeira.
               
Depois fui voltando, sentei-me num cais improvisado, a olhar para o céu que misturava o azul com o laranja, ia vendo as pessoas a passar do outro lado do pequeno rio, e a senhora, também com o seu chapéu cónico, que conduzia o seu barco como uma gondoleira, e que me perguntava, apesar de eu já ter respondido “boat ride”?
               
Tudo isto me abraçava e eu senti-me profundamente feliz e até sortudo em estar ali. Sempre defendo que a sorte não tem nada a ver com o que um gajo faz. Mas confesso que me senti sortudo, quanto mais não seja sortudo por ter tido o código genético e as vivências que me permitiram ser alguém que segue os seus sonhos.
               
Atravessei a ponte, tirei a foto àquele casal que mo pediu. Tirei uma fotografia a mim próprio  - aquelas típicas do braço esticado e do sorriso modesto. Sentei-me no restaurante, mesa p’ra um, abri o computador, pedi comida e uma cerveja de 0,15€. E passado duas horas corri as ruas durante uma meia hora, sem saber já bem o que fazer. E aí senti que me faltava alguém para partilhar a beleza deste sítio, ou com quem me sentar a ver a banda passar. Ao mesmo tempo, não me apetecia meter conversa com pessoal e arranjar um grupinho p’rá noite. Não sei se me senti triste ou não. Não sei se foi bem isso, até porque, se o foi, foi triste por não ter alguém com quem partilhar a alegria que esta vila me transmite, o que, sinceramente, não faz pleno sentido.
               
Recordo-me de quando me autoatribuí, no messenger, a alcunha de “Lone Rider”. É quase ridículo admitir que isso me surgiu por ter feito algo tão mundano quanto ir sozinho ao Rock in Rio, em 2008. É ir de Vale de Cambra (ou de Coimbra, não me lembro) para Lisboa, passar uma tarde e uma noite, e voltar. Tão simples quanto isso. Mas se calhar, e até sem bem o saber na altura, foi aterrando a noção de que o facto de andar sozinho nunca me impediria de ir fosse onde fosse, de fazer fosse o que fosse. Acontece vezes sem conta com quase toda a gente, e acho uma pena. Não só porque se fazem amigos em qualquer lado, e a solidão acaba por ser algo que apenas esporádica e, creio, saudavelmente nos bate à porta, mas também porque, para mim, vale mais a solidão de estar em paraísos dispersos pelo mundo, do que a solidão de estar preso no nosso quarto, na nossa casa, na nossa terra, no nosso mundo de onde até queremos escapar, nem que seja só de vez em quando.
               
Assim, esses sentimentos aparecem, claro que sim. Sou um gajo, feito de carne e osso, que gosta de ouvir uma música mais tristinha (Moby – Rockets) de vez em quando para ir de encontro ao seu coração que docemente se auto-embala e que se sente alegre, triste, zangado, feliz, cansado, só, exasperado, entusiasmado, esperançoso, iludido, medroso, desiludido e expectante. Esses sentimentos fazem parte de mim e não lhes nego o lugar que têm aqui por estes lados.
               
E é no negar desses sentimentos, na expectativa pessimista de quem se deixa governar pelo medo de se sentir frustrado, só ou perdido que reina a indecisão de se ficar pelo que se conhece. Quem quer curtir vai curtir, seja de que maneira for, e com que ritmo for. Quem tem medo de que algo vá acontecer e age de uma forma milimetricamente preparada para que tal não aconteça, verá a segurança ao seu redor, mas as surpresas a voar, com asas de ouro, do outro lado da gaiola, perto o suficiente para se saber que estão ali, mas apenas longe o suficiente para não se poderem tocar e agarrar.
               
Vamos abraçar isto que vai cá dentro.

21h50-3ª-26-7-11
no quarto do hotel em Hoi An
                
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"boat ride, boat ride?" - que soava mais como "bô rai, bô rai?"

just chillin'

um bocadinho mais à esquerda ainda se vê um bocado dos putos, que se divertiam na água

caminhando por estas ruas mergulhei um bocado no vietname sem turistas - sublime

este cota andava com o seu barquinho, p'ra trás e p'rá frente, com as (imagino) netinhas sempre a palrar e (imagino) a sorrir. deu-me ideia de ser daquelas cenas que elas vão lembrar para sempre tipo "lembro-me quando era chavala, costumava ir pescar com o meu avê, era tão fixe..."
as casas tinham duas cores: amarelo, e amarelo esbatido


sinto-me grande no vietname. essas lonas cobriam o mercado todo e na maior parte dos sítios um gajo tinha de andar curvado, sendo que estavam p'rai a metro e meio de altura

pôr do sol

2 Comments:

At 28.7.11, Blogger ::Andre:: said...

Que bela leitura de fim de tarde, adorei...

 
At 1.8.11, Blogger naSum said...

Gostei muito também. Grandes fotos :)

 

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