Eu não sou cozinheiro há muito tempo, embore cozinhe há uns 20 anos - aprendi novo, quando era escuteiro.
De todos os empregos em que estive desde que me entreguei voluntariamente à escravatura do mundo laboral, este é sem dúvida dos mais interessantes - acima deste fica a experiência como relações públicas numa galeria de arte contemporânea, que de certo modo ia mais de encontro à minha vocação e formação.
A coisa boa de se ser cozinheiro é ver, objectivamente, o resultado do nosso trabalho a evoluir.
Escolhem-se os ingredientes, preparam-se, cozinha-se, serve-se.
Vemos o
ciclo do início ao fim; estas contemplações metafísicas não são assim tão frequentes em muitos outras actividades laborais - demiti-me de um emprego confortável como administrador de sistemas numa seguradora porque o resultado do meu trabalho era demasiado abstracto. Quando o trabalho de um
sys admin é bem feito, nada acontece... a rede bomba, os
servers estão estáveis e o pessoal tem linhas telefónicas. Para mim, isso era demasiado próximo de um nada absoluto, quero dizer, eu estava a trabalhar para que nada acontecesse. Uma espécie de
wei-wu-wei pervertida: uma Inacção pela Acção.
Adiante.
Para além de me proporcionar (óbvio) material para profundas reflexões e um evidente escape criativo, cozinhar permite-me também expor algumas preocupações ou interesses pessoais de modos subtis (e por vezes, subversivos). O meu Seitan Esclarmonde permite-me sempre falar um pouco do Catarismo e os meus pratos marroquinos ou turcos tornam as pessoas mais sensíveis a uma imersão cultural no Islão (gosto eu de acreditar).
Como a receita hoje é turca, vamos ouvir uma modinha Sufi cantada pelo grandioso Nusrat Ali Khan, para animar e vamos fazer Baklava, uma sobremesa tradicional muito boa.
Recheio
12 folhas de massa phyllo
3 chávenas (ch) de avelãs trituradas
1 ch amêndoas (ou nozes) trituradas
Calda
1 cl café de canela
1/2 cl café de cravinhos partidos
1/4 ch de óleo
1 1/4 ch açúcar mascavado
1/4 ch sumo de limão
2 cl sopa de raspa de limão
2 cl sopa de melaço (ou seiva de ácer, a receita original leva mel)
1 cl chá baunilha
Primeiro de tudo, untar um tabuleiro com um pouco de óleo.
Preparamos a massa phyllo de modo a obter 12 folhas do tamanho do tabuleiro. Deve-se manusear com muito cuidado pois é uma massa muito fina.
Colocamos 6 folhas de massa (devem ser untadas com um pouco de óleo individualmente) no fundo do tabuleiro e espalhamos metade do recheio de frutos secos com cuidado e uniformemente e cobrimos com mais três folhas.
Repetimos o processo e colocamos nova camada de recheio cobertos com a massa e colocamos no forno, untando igualmente a última camada com mais um pouco de óleo.
Depois, com uma faca afiada, fazemos quatro golpes verticais ao longo do tabuleiro de modo a cortar todas as camadas.
Fazemos 5 golpes na horizontal e cortamos cada pedaço diagonalmente. Dá trabalho mas ajuda a cozinhar e dá um aspecto muito bonito.
Pomos no forno a 350 graus durante 20 minutos e baixamos a temperatura para 300 graus e cozinhamos mais 25 minutos ou até estar castanho dourado.
Enquanto isto vai ao forno, preparamos a calda misturando todos os ingredientes num pequeno tacho e aquecemos até espessar.
Assim que a Baklava sair do forno, vertemos a calda uniformente, deixamos arrefecer e servimos.