Caving—also occasionally known as spelunking in the United States and potholing in the United Kingdom—is the recreational pastime of exploring wild (generally non-commercial) cave systems.
Hoje acordei, meu quarto de hotel semi-podre em Vang Vieng, no Laos, e não sabia bem o que ia fazer. É o que acontece muitas vezes. Tanto podia ir fazer tubing, como dar uma volta por aí, como esperar que o Hugo chegasse e ver o que queria fazer...
Assim, almoçei nas calmas, aluguei uma bicicleta e fui dar uma volta. Queria ir ver onde era o hostel onde a Elena estava para ver se a encontrava. Fui lá mas ela não estava. Tubing? Na, fica p’ramanhã...
Ora tinha alugado a bicileta naquele gajo, e não no outro, porque este oferecia um mapa. Fixe. Peguei no mapa feito à mão, uma daquelas folhas fotocopiadas dezoito centenas de vezes, e vi onde queria ir. Ok, atravesso a ponte, sigo, sigo... iá, deve ser isso.
Debaixo dos chuviscos, comecei a pedalar. Num instante cheguei à ponte, onde tive de, mais uma vez e estupidamente a meu ver, pagar quarenta cêntimos para atravessar, passei. A caminho o mapa decidiu que já bastava de estar ao serviço de outros, e tentou o suicídio. Apanhei-o antes que o rio o fizesse, e segui caminho. Num instante já não sabia bem onde estava. Eu não sou muito bom a orientar-me (chego de Portugal ao Nepal por terra, de Singapura ao norte do Laos também por terra sem problemas, mas saio de casa, dou duas voltas ao quarteirão e já não sei bem onde estou) e o mapa também não era dos melhores. E até avisava – “not to scale”. Mas ok, continuo a pedalar entre os campos de arroz e duas chavalitas saltam para o meio da estrada a apontar para a gruta. Fixe, é p’ráli.
Saio da bicileta, preparo-me para me por a caminho e digo, com gentileza, às chavalinhas que não ia precisar de guia. Quem, eu? ‘Tás é maluca! Por acaso nem foi mau de todo. O caminho, por outro lado, não foi dos melhores. Mas é daquelas cenas. Tão “nada a ver com nada” que um gajo adora. Demorei p’rai quarenta minutos p’ra fazer um quilómetro, isto porque tinha de me equilibrar como um trapezista para não deslizar na lama entre os campos de arroz e não cair num destes. Num rasgo de esperteza, deixei as havaianas na bicla, e assim sempre era mais fácil. Porque andar de chinelos num sítio onde te enterras em lama até ao joelho é má ideia.
Eventualmente lá consegui sair dos campos de arroz. Tive de passar por uns bambus que estavam ali para ajudar a malta, saltar uma cerca e vi um barraco onde estava um maço de tabaco e um sinal a dizer para pagarmos 10000kip, um euro. Mas o gajo não estava lá! Porreiro. Se calhar tinha ido mijar por isso, pé ante pé, passei pelo barraco e segui sempre em frente. Apenas para voltar vinte minutos depois, pois não encontrava gruta nenhuma. O gajo viu-me, veio pedir-me para pagar, e assim o fiz. Depois caminhou e disse para o seguir. Ele caminhava naqueles seixos como se fosse algodão e aqui o europeuzinho sofria um bocado para o acompanhar.
Chegámos à gruta. Estava à espera de uma cena aberta, enorme, mas a entrada era do tamanho de meia pessoa. Cinco inglesas estavam a sair.
- Que tal?
- Não sei, não chegámos a descer – respondeu uma.
- É assustador, e eu já me estava a sentir zonza – disse outra.
- Eu ainda fui um bocado, com o guia, mas depois, quando ele ‘tava a descer mais p’ra baixo um escadote partiu e voltámos para trás, ele não queria ir mais – disse a terceira.
Eu não sabia bem o que pensar daquilo. Por um lado isto só me atraía mais, mas por outro já estava a ficar um bocado cagado. Mas ok, siga. O gajo apareceu, deu-me uma lanterna daquelas que se põe na cabeça mas que levei na mão, e entrámos. Ok, sim, estava a ver porque é que diziam que era assustador. Imaginem sinuosos corredores onde um gajo às vezes tem de passar de lado, pequenas poças de água lamaçenta que nos chega à bacia, subidas por uns escadotes completamente podres... era pior que isso. Tanto que passados os primeiro cinco minutos o gajo disse “vamos voltar para trás”. Estive quase, mas tinha de continuar. Ele nem insistiu, bazou logo e lá fiquei, sozinho, na escuridão. Ele tinha bazado antes de descer o tal escadote cujo degrau se tinha partido. Eu segui com cuidado, aguentando-me nas paredes com os cotovelos, tentando não me armar em campeão. Isto porque o solo era mais escorregadio do que os melhores dias da Cicciolina. O próprio gajo escorregou um par de vezes. Agora imaginem escorregar gruta abaixo e estatelar-se todo num sítio de onde será quase impossível retirar-te assim sem mais nem quê.
Quando tentava descer o famoso escadote, foi a minha vez de partir um degrau. Um instante apenas. PAU! Não sei como aguentei-me no seguinte e não deixei cair a lanterna. Só pensava “se esta lanterna cai ou fica sem pilhas o próximo filme do Danny Boyle vai ser sobre mim”. Não é bem o mesmo, mas se a lanterna ficava sem pilhas acho que só no dia seguinte é que aparecia alguém, e nos entretantos eu ficava lá encharcado, enregelado, no breu mais breu que o mundo conhece. Mas estou agora a escrever isto, por isso não aconteceu nada, já se sabe.
Segui caminho. Queria voltar para trás, e às vezes desejava que depois da próxima curva acabasse. Mas o curioso, é que não o queria verdadeiramente. Uma pequena parte de mim sim, mas a outra parte de mim, ainda que a parte inteira estivesse toda cagada de medo, queria seguir, e aventurar-me o máximo possível. O meu coração batia fortemente e sentia uma adrenalina como não sentia há anos, e naquele momento senti-me plenamente vivo. Naquele momento eu era os meus sentidos. Era um animal, um inteligente animal que cometia a estupidez de ir a um sítio só porque sim. Comparava com a Europa o que me rodeava. A geografia daquela gruta, os escadotes todos podres e a rebentar e aquele solo escorregadio faria com que nunca se sonhasse em fazer aquela cena sem um guia, ou sem butõezinhos ao longo da gruta onde um gajo pudesse carregar quando em apuros. Concerteza haverá cenas destas, mas off-circuit, imagino. Se houver alguns “cavers” por aí, que me corrigam.
Apareceu, entretanto, o que seria a etapa final. Já tinha passado, curvado, por zonas onde a água me chegava à cinta. Mas agora era todo um caminho. Volto para trás ou não? Respirei fundo, com dificuldade, e segui. Nadei um pedaço com cuidado para não deixar cair a lanterna e consegui, era esse o fim. Voltei para trás, tentei dominar-me e continuar a ter cuidado apesar de já ter acabado. Saí cá para fora. Passado meia hora ainda estava a tremer.
Foi, sem dúvida, uma das cenas mais fixes que fiz nesta viagem.
22h25-d-7-8-11
Vang Vieng, Laos